Família Indo-Europeia e o Latim como Base
A Família Indo-Europeia e o Latim como Base da Língua Portuguesa
A língua portuguesa, falada hoje por mais de 260 milhões de pessoas em diferentes continentes, é resultado de uma longa história de transformações linguísticas e culturais. Para compreendê-la, precisamos voltar milhares de anos. Essa jornada ajuda a entender por que nossa língua tem tantas semelhanças com outras, e ao mesmo tempo, características únicas.
1. O que é a família indo-europeia?
A chamada família linguística indo-europeia é o conjunto de línguas descendentes de um tronco comum hipotético, denominado proto-indo-europeu (PIE). Essa língua ancestral teria sido falada por povos nômades há cerca de 6.000 a 4.000 anos a.C., provavelmente em regiões entre o leste da Europa e o sul da Rússia (a teoria mais aceita é a da estepe pôntica).
Do proto-indo-europeu surgiram diversos ramos linguísticos, que se expandiram junto com as migrações e invasões de povos antigos. Hoje, o indo-europeu é a maior família de línguas do mundo em número de falantes, abrangendo idiomas como:
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Românicas: português, espanhol, francês, italiano, romeno.
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Germânicas: inglês, alemão, sueco, neerlandês.
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Eslavas: russo, polonês, tcheco, búlgaro.
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Indo-iranianas: sânscrito, persa, híndi.
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Célticas: irlandês, gaélico escocês, galês.
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Helênicas: grego.
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Bálticas: lituano, letão.
Essa diversidade mostra como uma língua ancestral se fragmentou e se transformou, dando origem a culturas e tradições linguísticas tão distintas, mas ainda com traços comuns.
2. O latim: herdeiro e transmissor
Entre os ramos do indo-europeu, o italiano foi aquele que deu origem ao latim, a língua da Roma Antiga. O latim começou como o idioma de uma pequena comunidade no Lácio (região onde hoje está Roma), mas, com a expansão do Império Romano, espalhou-se pela Europa, norte da África e parte da Ásia Menor.
O latim tinha duas formas principais:
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Latim clássico: usado pela elite culta, em textos literários, jurídicos e políticos (exemplo: Cícero, Virgílio, Ovídio).
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Latim vulgar: a língua cotidiana do povo, marcada pela oralidade, simplificação e influência de outras línguas.
É do latim vulgar que nasceram as línguas românicas, incluindo o português.
3. Do latim às línguas românicas
Com a queda do Império Romano (século V), o latim vulgar fragmentou-se em diferentes regiões da Europa, influenciado por línguas locais, invasões bárbaras e transformações internas. Esse processo deu origem às chamadas línguas neolatinas ou românicas, como o espanhol, o francês, o italiano, o catalão, o romeno e o português.
O português, em particular, nasceu do galego-português, língua medieval falada no noroeste da Península Ibérica entre os séculos IX e XIII. Essa variedade derivava diretamente do latim vulgar falado na região, mas também absorveu elementos das línguas pré-romanas e, mais tarde, do árabe.
4. Vestígios indo-europeus no português
Mesmo sem termos acesso direto ao proto-indo-europeu, é possível identificar palavras e estruturas herdadas desse tronco linguístico.
Alguns exemplos de raízes indo-europeias que chegaram até nós:
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Māter (PIE) → mater (latim) → mãe (português).
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Pater (PIE) → pater (latim) → pai (português).
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Septm̥ (PIE) → septem (latim) → sete (português).
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Ōwis (PIE) → ovis (latim) → ovelha (português).
Essas conexões explicam por que encontramos semelhanças entre palavras de diferentes línguas indo-europeias. Por exemplo, "mother" (inglês), "mutter" (alemão), "madre" (espanhol) e "mãe" (português) têm a mesma raiz.
5. A importância do latim na formação do português
O latim não apenas forneceu o vocabulário, mas também a estrutura gramatical básica do português:
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Ordem das palavras (sujeito-verbo-objeto, com variações).
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Uso de gêneros (masculino e feminino).
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Conjugação verbal rica e variada.
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Flexão nominal e verbal.
Até hoje, cerca de 80% do vocabulário português tem origem no latim.
6. Curiosidades
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O português e o romeno, apesar da distância geográfica, são línguas irmãs muito próximas devido à origem comum no latim.
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Algumas palavras do latim clássico sobreviveram quase intactas: “luna” → lua; “rosa” → rosa.
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O latim não é uma língua morta: além de ser estudado, continua usado oficialmente no Vaticano.
Referências para consulta
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BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 38ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
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COUTINHO, Ismael de Lima. Pontes de História da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Ática, 2005.
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FARACO, Carlos Emílio. História Sociopolítica da Língua Portuguesa. São Paulo: Parábola, 2016.
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CRYSTAL, David. The Cambridge Encyclopedia of Language. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.
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HAMP, Eric P. Indo-European Languages. In: Encyclopaedia Britannica, 2023.

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