O Tempo e a Sabedoria das Plantas: um Ensaio sobre Agir, Não Agir e Confiar
Foto do meu jardim: Hibisco
O Tempo e a Sabedoria das Plantas: um Ensaio sobre Agir, Não Agir e Confiar
Por Flávia Santosa
Quando criança, eu tinha o hábito silencioso de folhear algumas páginas da Bíblia, detendo-me especialmente em determinados evangelhos do Velho Testamento. Meus preferidos eram os Salmos, os Provérbios e, sobretudo, o Eclesiastes. Em um de seus versículos, deparei-me com a afirmação: “há tempo para tudo debaixo dos céus”.
Essa frase, como um conto sagrado, jamais saiu da minha cabeça. Ela me acompanhou ao longo dos anos, ora como um consolo, ora como um mistério. Entretanto, não possuía, então, plena compreensão do seu alcance. A ansiedade do mundo, a pressa das coisas, o desejo de imediatismo não permitiam que eu percebesse, na prática, o que aquele enunciado significava. Assim, segui acreditando, mas não compreendendo.
Hoje, algo se revelou ao observar as plantas do meu jardim. Ao me dedicar a replantar algumas e a perceber outras que, discretamente, já começavam a brotar, entendi que cada coisa possui um tempo certo para se desenvolver. Não é o tempo que eu desejo, mas o tempo que é preciso. Cada elemento, no sentido mais amplo, possui um ciclo específico, um ritmo próprio, e tentar apressá-lo só resultaria em imperfeição.
Eis a perfeição das coisas: o tempo.
Aqui, finalmente, me deparo com a pergunta que sempre me rondou: como posso compreender a ação do tempo em nós, no dia a dia, em tudo que há no mundo? O que, afinal, é o tempo? Por que ele existe?
Essas indagações parecem infinitas. Surge também a tentação de querer controlá-lo: será que podemos segurar, acelerar ou reduzir o tempo? Como encontrar a neutralidade diante dele? Como buscar o equilíbrio entre o agir e o esperar? Como aceitar o tempo, quando tudo à nossa volta — e dentro de nós — clama por soluções imediatas para as mazelas pessoais e coletivas?
Será possível viajar no tempo?
Como o tempo se comporta fora do planeta?
Ele é linear ou multidimensional?
Para além da vida material, como funciona o tempo?
Mesmo as noções mais concretas que temos do tempo são invenções humanas: o calendário, as horas marcadas pelo relógio, os fusos horários… Foram baseadas em observações astronômicas, na rotação da Terra, na translação em torno do Sol, mas, ainda assim, são tentativas de medir o que, talvez, seja imensurável. São convenções — úteis, necessárias, mas quem pode garantir sua precisão absoluta?
Além disso, como o tempo funciona no mundo espiritual? Será diferente daquele que rege o mundo físico? E ainda: o tempo se manifesta de maneira diversa para animais, vegetais e minerais?
Entretanto, foi observando as plantas que compreendi algo essencial: não importa o número de perguntas, não importa o esforço em desvendá-las — nós não controlamos o tempo. Apenas aprendemos a conviver com ele.
A natureza nos ensina, silenciosamente, que tudo se move segundo ciclos que se repetem, mas não se apressam. Ao entender esses ciclos, conseguimos nos harmonizar com o tempo: assim nasce a agricultura, assim os seres humanos adaptaram suas vidas, assim seguimos erguendo nossas civilizações.
Por isso, hoje percebo que, para realizar meus projetos, para cumprir meus propósitos, preciso saber esperar. E esse esperar não é uma paralisia. Ao contrário, significa a sabedoria de agir e não agir.
Lembro-me, aqui, do Tao Te Ching, que fala justamente disso: a ação harmoniosa, o não forçar, o deixar ser. As plantas não se angustiam, não tentam florescer antes de enraizar. Elas simplesmente fazem o que precisam fazer: absorver a água, buscar a luz, crescer para cima ou para os lados, conforme sua natureza pede. Enquanto elas reagem e se adaptam, o tempo segue, e o resultado acontece quando é o momento certo.
Assim também deve ser a nossa vida: um equilíbrio entre o movimento e a entrega, entre a ação e a paciência, entre o querer e o aceitar.
O tempo, com suas lições silenciosas, me ensina a agir com propósito, mas também a confiar no fluxo da vida. Como as plantas, sigo, cresço, floresço — no tempo certo.
Flávia Santosa
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