A Luz de Clarice
Com uma linguagem muito simples criei essa história fictícia de bases muito reais, com a personagem Clarice representando a realidade daqueles que a sociedade, por muito tempo, negligenciou.
A vida nunca foi muito fácil para Clarice. Ela não teve uma infância saudável como a maioria das crianças. Nasceu cega, filha de pais alcoólatras, e foi abandonada ainda pequena em um orfanato. Cresceu envolta pela escuridão e pela ausência — de afeto, de família, de um lar. Sua realidade era feita de vozes desconhecidas, de passos que vinham e iam, de crianças que também carregavam dores profundas e histórias partidas.
O orfanato em que vivia, era repleto de problemas. Muito mal administrado, não tinha recursos necessários para a sua manutenção, tampouco para investir em educação. Além disso, o número de crianças e adolescentes era muito superior à sua capacidade de acomodação, lotando os quartos e, consequentemente, causando inúmeros transtornos à todos. Estavam todos entregues à própria sorte. Porém, Clarice nunca desistiu de sonhar.
E foi naquele cenário de abandono que Clarice encontrou os primeiros sinais de força para resistir e esperar. Em meio ao vazio, ela descobriu uma espécie de escuta interior, nutrindo a esperança de um lar, que mais tarde, se concretizaria e, assim, ela teria no futuro condições de auxiliar aqueles que, como ela, foram descartados pela família e pela sociedade.
Era uma promessa.
Um dia, quando menos esperava, a vida lhe estendeu a mão. Foi adotada por um casal de meia-idade, com ternura transbordando no peito e um amor paciente e acolhedor.
Ela os recebeu, e foi recebida. Não apenas foi adotada: ela também os adotou. A verdadeira história de Clarice começou ali, quando passou a fazer parte de uma família que acreditava nela. Com apoio e estímulo, ela aprendeu a ler e a escrever por meio do sistema Braille. Descobriu que o conhecimento era uma janela aberta para dentro de si e para o mundo.
Clarice cresceu e floresceu. Formou-se pedagoga e, ainda, com o incentivo dos pais e a colaboração de pessoas comprometidas com a inclusão, fundou uma escola voltada ao acolhimento de pessoas com cegueira ou limitações visuais. Mais do que isso, ela se especializou e criou métodos acessíveis, sensíveis e humanos. Sua missão era clara: oferecer sentido, rumo e autoestima a quem, como ela, havia crescido sem saber por onde caminhar.
Ela compreendia que muitas pessoas não só tinham os olhos fechados para o mundo exterior, mas também carregavam um tipo de esvaziamento interno — uma ausência de horizontes, de sonhos, de perspectivas. Clarice se tornou esse farol. Iluminou com sua presença os caminhos que antes pareciam inalcançáveis. Ofereceu direção a quem se sentia perdido. Ressignificou vidas.
Promessa cumprida.
Que a vida seja repleta de Clarices, clareando o caminho de tantas outras almas à procura de luz, de sentido e de acolhimento.
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