
René Descartes
O "Discurso do método", é uma das mais importantes obras para filosofia moderna, nela Descartes faz uma abordagem para a dúvida metódica e a busca por conhecimento. Por essa razão, escolhi como minha primeira reflexão.
A impressão que tenho do livro é, de certa forma, espelhada: ele reflete algo em mim, e por isso me identifico com muitos de seus pontos.
René Descartes me causa uma boa impressão justamente porque sua proposta vai ao encontro da forma como eu também enxergo o mundo. Compartilho com ele o hábito de observar as pessoas, seus gestos, a entonação das palavras, os silêncios entre uma frase e outra. Observar é, para mim, uma forma de pensar. Gosto de perceber a intencionalidade por trás de cada fala. O corpo tem uma linguagem própria, e muitas vezes acaba revelando o que a mente tenta esconder.
Percebo que nem sempre as pessoas dizem o que realmente pensam. Isso não vale apenas para as conversas do dia a dia, mas para tudo o que consumimos como informação: livros, discursos escolares, textos online, blogs, jornais, redes sociais. Estamos cercados por discursos e é essencial que aprendamos a olhar para eles com um olhar mais crítico, mais atento, mais desconfiado até. Não se trata de negar tudo, mas de não aceitar tudo como verdade absoluta.
Descartes fala da dúvida como um método e eu compreendo isso não apenas como uma proposta teórica, mas como algo que vivi na prática. Aprendi a questionar ainda na infância.
Naquela época, eu recebia diferentes tipos de informações: o que se dizia na escola e o que se ensinava na catequese, quando fiz o catecismo, como era de praxe para quem foi batizado na Igreja Católica. Mas havia contradições. Os conteúdos escolares, especialmente sobre a origem do mundo, não coincidiam com as narrativas religiosas. Foi ali, entre uma sala de aula e a igreja, que algo em mim começou a desconfiar — e esse movimento de questionamento permanece até hoje.
Com o tempo, entendi que tudo o que se ensina na escola faz parte de um projeto, de uma sequência pensada para acompanhar o crescimento da criança. Ainda assim, na minha época, a educação pouco incentivava a participação ativa dos alunos. Era um sistema mais transmissivo, menos dialógico. Felizmente, vejo que isso tem mudado: há mais espaço hoje para que a criança desenvolva seu senso crítico, para que aprenda a pensar e não apenas a repetir.
E é aí que a filosofia cartesiana se revela ainda mais atual. A importância de não aceitar nenhuma informação como verdade absoluta; esse alerta de Descartes continua ecoando. Ao longo da vida, percebi que esse gesto de duvidar é um sinal de consciência ativa, de um pensamento que se movimenta.
Continuo me identificando com Descartes especialmente quando ele entra em temas mais profundos: a existência de Deus, a consciência humana, e a diferença que ele estabelece entre a consciência dos seres humanos e a dos animais. São questões que me provocam e me acompanham há muito tempo.
Também me identifico profundamente com Descartes quando ele fala sobre a existência de Deus. Para mim, faz todo o sentido a ideia de uma inteligência superior ; uma orquestra invisível que criou tudo o que existe. Uma fonte criadora que está por trás do movimento dos planetas, das estações, das formas de vida, do equilíbrio delicado entre o caos e a harmonia.
Nada me parece ser obra do acaso. A perfeição que percebo na natureza, nos mecanismos da vida, especialmente no corpo humano, me leva a essa mesma conclusão: há inteligência ali. Os batimentos do coração, o funcionamento preciso de nossos órgãos, os sistemas interligados que nos mantêm vivos; tudo isso carrega a marca de um projeto. Um projeto que não é humano, mas que nos envolve e nos ultrapassa.
Descartes acreditava que essa inteligência era Deus e eu compartilho dessa visão, embora talvez com uma linguagem diferente. Para mim, há algo que coordena e sustenta o que somos, algo que está além da matéria e que se reflete em nossa consciência: essa capacidade de saber que existimos e de nos perguntar sobre o sentido de tudo.
No entanto, há um ponto em que me distancio de Descartes: sua concepção sobre os animais. Entendo o contexto da época em que ele escreveu ; a ciência ainda engatinhava em relação ao entendimento da mente animal. Mas hoje sabemos que os animais também possuem uma forma de consciência.
É uma consciência diferente da humana, claro. Mais instintiva, limitada, circunscrita a um campo de sobrevivência e adaptação. Mas ela existe. Os animais sentem, percebem, aprendem, reconhecem seus pares e o ambiente ao redor. Ainda que não desenvolvam pensamento abstrato nem raciocínio complexo, sua forma de consciência não pode mais ser ignorada.
A grande diferença, ao meu ver, está na racionalidade. Nós, humanos, somos capazes de refletir sobre nós mesmos, de pensar criticamente, de construir símbolos e atribuir sentidos. Isso nos permite compreender — ou ao menos intuir — que há algo além da matéria, algo como a imortalidade da alma.
A alma, para mim, é um reflexo da inteligência que nos criou. E se essa inteligência é Deus, então é natural imaginar que, sendo Ele um ser inteligente, tenha criado outros seres também inteligentes. Isso me leva a crer que há, sim, outras formas de vida além do que podemos ver e tocar. Outros mundos, outras dimensões — possibilidades que escapam à razão, mas que fazem parte dessa busca constante por sentido.
Encerrando esse meu pensamento, posso afirmar que O Discurso do Método, de Descartes, oferece uma contribuição de valor inegável ; não apenas para a filosofia, mas para toda a estrutura do pensamento moderno. Apesar de algumas diferenças compreensíveis entre seu tempo e o nosso, afinal, vivemos no século XXI, em um mundo profundamente transformado pela ciência e pela tecnologia. A essência do que ele propôs permanece viva e necessária.
Sua obra nos convida a duvidar, a observar com atenção, a pensar com clareza. Foi essa proposta que influenciou o surgimento da ciência moderna, o avanço das tecnologias e o fortalecimento de uma mentalidade investigativa e crítica que molda o mundo até hoje.
Descartes nos ensinou que pensar é existir, mas também nos inspirou a não aceitar verdades prontas. Ele nos mostrou que a razão é uma ferramenta poderosa, e que o pensamento analítico e o rigor do método são caminhos para compreender melhor a nós mesmos e o universo ao nosso redor.
Mesmo com as diferenças entre a sua visão de mundo e os conhecimentos que temos hoje, sua contribuição continua viva, como uma base sólida sobre a qual muitos ainda constroem. E, para mim, isso é o mais impressionante: que um homem, com sua mente inquieta e suas perguntas tão profundas, continue dialogando com os que pensam séculos depois. Como se ainda estivesse por aqui, nos convidando, gentilmente, a duvidar.
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